de música

Eu não sou uma pessoa musical. Você praticamente nunca vai me pegar ouvindo música. Estou sempre de fone, mas ouvindo podcasts (aliás, recomendo altamente, e estou disponível pra explicações e dicas várias, se quiserem). Antes de descobrir podcasts, não ouvia nada. Na Itália só ligava o rádio de manhã, no carro, pra ouvir Il Ruggito del Coniglio, um programa apresentado por dois comediantes maravilhosos. Quando ia ao cinema sozinha, à noite, botava Monobloco pra dar uma animada. E só. Honestamente, não sinto falta. Não ouço música, não canto, não danço. Nada, nunca. (Sim, sou chata)

Incompreensivelmente, quando por acaso me encontro em uma situação musical, ou dançal, costumo ficar extremamente emocionada, mesmo quando a música é agitada, animada, rápida, upbeat. Ver pessoas dançando me dá a mesma sensação de que o mundo está em harmonia, sabe. Não sei explicar, mas há algo de muito mágico em um certo número de pessoas cantando a mesma música, ou se movendo em conjunto, os corpos obedecendo ao comando mental, cortando o ar, ocupando espaços de maneira temporária, com ou sem coreografia, com ou sem improviso. Gosto de ver até gente que dança mal. Gosto de ver até danças com música que abomino (exceção é o sertanejo, que me dá urticária). Ano passado, quando fui ver minha turma de balé dançar, eu chorava e tremia tanto que mal conseguia segurar o celular. Mês passado fui ao concerto do CINDACTA e quase tive um treco; fiquei extremamente tocada. E nem foi pela playlist, que foi muito boa mas não particularmente emocionante; o que me deixa boba mesmo é exatamente essa coisa de conjunto, de todos fazendo um pouquinho pra chegar num todo muito foda, é a empolgação. Chegou um cara pra cantar uma música do Phil Collins; um negro alto, forte, sorridente, com a maior pinta de ser dono de um vozeirão estilo Mufasa. O timbre dele era bem mais agudo, de maneira alguma o que eu esperava, e o microfone ainda estava um pouco baixo demais, o que tornava a voz dele quase inaudível quando a orquestra subia. Mas cara, ele tava TÃO empolgado, tão claramente feliz de estar ali, estrela, protagonista, soltando a voz, karaokê, tão animado, tão tudo, sabe, tinha praticamente uma bolha de felicidade ao redor dele, era uma parada quase palpável, quase mensurável. Não era a minha música preferida da noite, mas certamente foi, pra mim, o melhor momento. Me deixou recarregada de felicidade por muitos dias. (obrigada pelo convite, família Andraus, seus lyndos!)

Uns meses atrás, não lembro mais o motivo, fui catar uns vídeos de Bollywood pra mostrar pra Carol. Detalhe que eu nunca tinha visto nenhum e mal sabia do que se tratava; ela deve ter me perguntado algo e eu fui procurar um vídeo pra ilustrar. Só que o negócio é altamente viciante, e não é só porque o algoritmo do YouTube fica te sugerindo mais e mais e mais – é que é uma coisa tão diferente que você fica naquele clima WHAT e acaba querendo ver mais e mais pra tentar entender. Fico absolutamente fascinada pelos tecidos, pelas jóias, pela grandiosidade dos cenários, pelo número de extras em cena, mas principalmente pelas coreografias. Os movimentos que eles usam são totalmente diferentes de qualquer coisa que nós, ocidentais, identificamos como passos de dança. As expressões faciais são claramente importantes pro contexto, mas não me perguntem o que significam, porque obviamente não sei. Mas mais do que tudo isso, eu vejo aquele grupo de pessoas fazendo aquele playback super fake, aquelas dezenas de pessoas dançando a mesma coreografia, e eu fico pensando como é possível uma espécie que cria isso, que chega nesse resultado, que consegue se juntar pra literalmente balançar o esqueleto ao mesmo tempo, como é possível essa espécie animal ser tão absurdamente escrota? A impressão que eu tenho é que deveria ser impossível um ser humano saber dançar ou cantar e ser uma pessoa merda. Sabe? É uma coisa tão maravilhosamente sensacional, tão elevadora de alma, tão transbordadora de peito com amor, tão estamos todos em harmonia, que é difícil conceber coisa mais maneira.

Desfile de escola de samba: eu choro. As alas coreografadas me matam do coração. As comissões de frente, o mestre-sala e a porta-bandeira acabam comigo. Me debulho em lágrimas mesmo quando a fantasia é incompreensível, a música acelerada demais, a letra repetitiva e vazia, o enredo ridículo. Show do Monobloco: choro. Trolls dançando disco music no final do filme: choro. Vídeo promocional dos DVDs do Guardiões da Galáxia 2: tá, num choro, mas fico embasbacada.

Então nesse momento estou fisicamente exausta depois de série nova de perninha na musculação, zumba, balé feito nas coxas porque eu mal me aguentava em pé, estou morrendo de sono, mas tô aqui fazendo o quê? Vendo isso aqui e chorando de felicidade. Boa noite.

7 ideias sobre “de música

  1. Oi, Letícia!

    Que bom que voltou a escrever!

    Para começar medias in res: amo música e não vivo sem podcast. Dos brasileiros, no momento, meus favoritos são o Braincast e os do Ondem. Também curto os da NPR, por exemplo. Podcast é vida.

    Leio o seu blog há muitos anos, mas acho que só comentei uma ou duas vezes. Não sabia que havia voltado para o Brasil! E nem imaginava que sua filha já estivesse tão crescida.

    Também não sabia que você fazia balé! Fiz quando criança, e era bem mais ou menos. Tenho muita vontade de voltar, mas adio por motivos de: joelho ferrado e sobrepeso. “Soprepeso” é delicadeza comigo mesma. Sei que soa cruel, mas tenho vergonha de me ver dançando na frente do espelho, habitando um corpo tão maior que aqueles que normalmente figuram nos collants de bailarina. Muito difícil superar esse desconforto, esse senso de inadequação. Medo (bobo, eu sei) de ser a hipopótama bailarina do grupo.

    Não rola um post sobre balé? Você já faz há muito tempo? Como é fazer balé em idade adulta?

    Abraço,
    L.

    • Oiê!

      Escuto o Braincast assiduamente e o ONDEM de vez em quando. Recomendo muito também o Anticast e o Mamilos, que você já deve conhecer. Os patrões do Anticast fazem o É Pau, É Pedra (EPEP para os íntimos), do qual já tive o prazer de participar (na verdade de dois spin-offs dele, o EPEP Filosofal, sobre Harry Potter, e o JAH!, sobre cultura e entretenimento; tem também o Feijoada Game Show, mas o episódio que gravei só vai ao ar dia primeiro agora).

      Voltei ao Brasil tem dois anos, mas estou em Curitiba, porque o Rio está inviável de todos os pontos de vista possíveis. Carol já tá com 8 anos!

      Comecei a fazer balé no início do ano passado. Do ponto de vista clínico, sou borderline entre sobrepeso e obesidade, mas malho todo dia religiosamnete há muitos anos, então minhas articulações nunca me deram problema. Minha solução pro problema de fazer balé sendo gorda é tripla: 1) não usar roupa de balé (faço aula de roupa de ginástica, praticamente meu uniforme no dia-a-dia); 2) não me olhar no espelho; 3) não me apresentar. Eu não danço balé; eu faço balé. Sim, eu sou a hipopótama da turma. Mas ou é isso, ou é ficar sem balé, então encaro. Sobre o fazer balé em idade adulta, isso honestamente nunca foi um problema pra mim. Se tem uma coisa que cria ZERO problemas na minha vida é o envelhecer. Nossa turma (carinhosamente apelidada de #piorturma, porque somos todos iniciantes) é maravilhosa, só tem gente ótima – acabei de voltar da apresentação nesse minuto, por sinal. Mas com toda a sinceridade, eu faria mesmo que fosse numa turma de crianças. Não tendo que me olhar no espelho, tá tranquilo.

      Se você tem vontade, faça. É bom demais. E depois me conta como foi :)

      • Oi, de novo!

        Obrigada pela resposta e pelas recomendações!
        Tinha ouvido falar do Anticast, mas nunca havia baixado episódios. Que engraçado conhecer a sua voz depois de todos esses anos! Seu sotaque é carioca mermo, com bashtante ênfase. Vinha dublando você bem mais light.

        Sou da época em que esse blog tinha foto e me lembro de você bastante “normal”. Nem macérrima, sem nada parecido com gorda.

        Eu tenho um problema degenerativo no joelho: na prática, meus pliés e elevés vêm com sonoplastia embutida. Não dói, mas incomoda muito. O problema surgiu do nada, não tem cura e só piora. It is a bliss – só que não.

        Meu problema com o balé é também uma questão de expectativa versus realidade. Na última montagem em que estive (o maravilhoso, lindo “Alice’s Adventures in Wonderland”), eu queria *ser* uma daquelas pessoas. Juro que eles voam e pairam no ar – eu vi. É muita beleza.

        Abraço,
        L.

      • Onde você ouviu a minha voz? Qual episódio? :)

        Menina, estou LOUCA pra ver o Alice, mas toda vez que tá rolando em Londres, eu não estou na Europa pra dar um pulo lá. Vou rapidinho em dezembro agora pra ver Sylvia, que é o meu balé preferido, com a Osipova, uma das minhas bailarinas preferidas. Já cheguei até a sonhar com ela, de tão animada que estou.

        Quanto ao seu problema degenerativo, se não houver contra-indicação médica, não vejo por que não dançar. Na minha turma tem gente com um pé que não faz ponta por causa de uma velha fratura, tem quem é super en dedans e os pés não abrem nem a pau, tem gente com flexibilidade zero, tem de tudo.

        Entendo PERFEITAMENTE o seu lance da expectativa versus realidade. Ontem, quando cheguei da apresentação e li seu comentário, escrevi um post em resposta, mas ainda não sei se vou publicar. Fica de olho que se eu me animar eu boto aqui.

        Beijo!

      • Oi, Letícia!

        Meu último comentário saiu meio confuso: sua voz eu ouvi não num episódio do Anticast, mas do EPEP. Baixei um hoje sobre Rick and Morty (?) – que nunca vi, aliás.

        “Alice…” é alegria de viver, vale cada centavo. Vou comprar o DVD, quero ir de novo etc. Vi com Maria Shirinkina. Ela se move como uma pluma. É bonito demais. Naquele dia, eu voltei a ser criança.

        Vou ficar de olho nos próximos capítulos, então. ;-)

        Abraço,
        L.

  2. Oi, fiquei feliz em ver publicação recente aqui no blog, faz tempo que sigo, e pensei que você tinha parado de publicar
    Adorava suas histórias da Itália. Vc voltou de vez pro Brasil? Carol (minha xará) está com quantos anos? Ainda está casada?
    Não pare, você tem um jeito especial de contar as histórias.
    Se der, me responde
    beijos para as duas.

    • Oi, Carol! Eu ando escrevendo quase nada mesmo, mas de vez em quando me dá uns 5 minutos, sabe como é. Voltei pro Brasil, mas “de vez” é um pouco definitivo demais, ainda mais considerando o horror que anda esse país. Essa onda retrógrada vai acabar por me expulsar daqui; não tenho nenhuma intenção de viver na Idade Média. Sim, ainda casada. Carol está com 8 anos já :)
      Obrigada pelo comentário, viu? Beijo!

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